Foto Acervo Gazeta Press

O Canhotinha de Ouro

Ante tantas relevantes perdas no mundo do futebol, que momento oportuno para comemorar a vida.
Nesta quarta-feira, 11 de janeiro, Gerson, o Canhotinha de Ouro, está completando 82 aninhos.
O canhota foi o meu primeiro grande ídolo rubro-negro, o responsável pela minha primeira frustração no mundo da bola, e o inspirador para que, ainda jovem, tivesse definido o que iria fazer na vida.

Naquele tempo, era motivo de orgulho e enorme alegria ver um jogador do clube de coração ser convocado para a Seleção Brasileira e, se não me falha a memória, na excursão da nossa seleção à Europa, no início dos anos 60, ouvido coladinho na Rádio Continental, no programa de meio dia, fiz um verdadeiro carnaval em casa com a notícia de que o jovem camisa 8 do Flamengo ia vestir a amarelinha.

A alegria não durou muito. Por desentendimento com o treinador Flávio Costa, que entendeu que na decisão do Campeonato Carioca de 62, Gerson deveria deixar de ser o homem de criação para ser auxiliar de marcador de Garrincha, meu ídolo, para meu desespero, acabou sendo negociado para o Botafogo. Ali nasceu em mim a certeza de que abraçaria o jornalismo, pois tudo que queria era bradar ao mundo o quão equivocados estavam nossos dirigentes abrindo mão de um verdadeiro gênio.
Em 1966, com 17 anos, comandei na Rádio Jornal de Itapetinga, na Bahia, em plena Copa do Mundo, meu primeiro programa esportivo…

Enquanto Gerson jogava e eu entrevistava, a amizade nasceu. Floresceu quando Gerson pendurou as chuteiras e resolveu ser comentarista. Lá estava eu, na Rádio Tupi, editando seu primeiro comentário. O que hoje ele tira de letra, no início foi meio complicado ter que resolver em três minutos e meio o que antes poderia ter noventa minutos…
No primeiro comentário a edição custou três baldes de fita…

Depois, corremos o mundo juntos, cobrindo, principalmente, a Seleção Brasileira, quando varávamos a madrugada. Gerson e o adorável treinador Oswaldo Brandão – que detestavam dormir – e eu, que adorava ouvir as histórias contadas por eles. O torneio da Independência, nos Estados Unidos, onde Roberto Dinamite e Zico brilharam, Gerson usou a sua cidade natal, Niterói, como desculpa para não ser multado.
Estávamos em dia de folga, voltando da Disney, onde o canhota, saudoso de Maria Helena e das filhas, havia se emocionado. O carro alugado, que mais parecia uma banheira, pois era enorme, levava na frente Gerson, dirigindo, eu e Doalcei.
No banco de trás, Radamés Lattari, saudoso pai do nosso Rada e à época diretor de seleções da CBF, Oswaldo Brandão e Ruy Porto.
De repente, do nada, uma perseguição policial ao nosso carro. Doalcei, nervoso, dizia para Gerson encostar o carro. Gerson retrucava, dizendo que não havia feito nada errado, que a perseguição policial deveria ser para outro veículo. Não era. Gerson foi fechado e teve que parar. Doalcei foi dialogar com o policial, que já desceu colocando a mão na arma. Gerson, nervoso, se dirigiu ao guarda e em bom português, sapecou: “o que eu fiz de errado? Não avancei nenhum sinal e estava devagar”. Doalcei traduziu rapidamente. Sua excelência, o policial, ouviu e tirou um talão da carteira, já sapecando a multa. Gerson inconformado, gritava: “não vou pagar!!!” Doalcei, mais calmo, perguntou o motivo da multa. A resposta foi curta e grossa: “o farol não estava ligado”. Doalcei traduziu e Gerson foi ao desespero. “Doalcei, diga a este incompetente que em Niterói basta a lanterna estar acesa!!!”
Dodô, em sabia decisão, resolveu pagar a multa…

Que bom poder reviver os momentos marcantes do passado, comemorando a vida e o dia de uma das mais adoráveis figuras humanas que tive o privilégio de conviver e, como bem disse Tostão em uma de suas geniais crônicas, cujo título foi “Os Pelés”, a mais perfeita e pragmática definição sobre Gerson, jogador de futebol : “o Pelé do meio campo.”

Parabéns, Papapinha!!!
Te amo!
VIVA A VIDA!


 
Em tempo:
Não posso deixar de contar a última do nosso gênio que aniversaria.
Não estava conseguindo falar com Gerson. O telefone chamava e ninguém atendia. Tentei mensagem e notava que não chegava, pois só um sinalzinho aparecia. Finalmente, notei que a mensagem havia sido recebida pelo aniversariante. Liguei. Feliz, Gerson atendeu, porém, cuspindo marimbondo, pois o seu celular fora vítima de pane inexplicável: “Isso é muito complicado para mim. Não domino, não é do meu tempo.”
E, concluiu: “Se fosse uma bola…”
Genial!!