Gato e rato

Desde que a imprensa esportiva existe, isto é, como diria um jovem e brilhante dirigente esportivo, “desde mil oitocentos e antigamente”, a briga do dia a dia reside no fato do dirigente imaginar, desenvolver e materializar uma contratação, e o jornalista correr atrás para, em qualquer dos estágios da ação do dirigente (imaginar, desenvolver e materializar), divulgar a notícia, até porque notícia não se guarda.

Já houve caso do jornalista que privava da amizade de um extraordinário dirigente rubro-negro, um dos responsáveis pela formação da geração Zico, no Cine Roxy, em Copacabana, quando os dois assistiam, se não me falha a memória, o filme Tubarão, ouvir o dirigente pensar alto e, ante colossal silêncio, pois o filme rolava, dizer: “Tive uma ideia. O Afonsinho resolve o problema do meio de campo do Flamengo. Preciso do telefone dele…”. Claro que o repórter não só conseguiu o telefone, como pode, ainda naquela noite, testemunhar a conversa e depois o encontro bem sucedido no apartamento dos Barões. Barão e Baronesa, eram Ivan e Ida Drummond. Os barõezinhos eram Otávio e Ivanzinho. Que saudade… Quanta saudade…

Bosco, em pé à esquerda, ao lado de Cantareli e Coutinho, em 1978.

Bosco, em pé à esquerda, ao lado de Cantareli e Coutinho, em 1978.

No caso contado, lua de mel, tudo perfeito entre Gato e Rato. Nem sempre é assim.  “Em mil novecentos e antigamente”, e acho que ainda hoje é assim, a sala do supervisor do futebol do Flamengo ficava muito próxima ao local onde os sócios assistiam aos treinamentos. Com um pouco de esforço, a conversa na sala de Domingos Bosco podia ser ouvida por um sócio mais curioso. Com o treino encerrado, já noite, Lineu de Lavor, querido companheiro de “O Jornal”, viu a luz da sala do Bosco acessa e sentiu uma movimentação diferente. Deu uma de cobra e, se arrastando, ficou posicionado embaixo da janela onde Bosco falava ao telefone e fechava uma contratação que, para ser anunciada, dependia do acerto com o jogador. Lavor saiu de fininho e ligou para a redação. No dia seguinte, BOOOMMMBA!!! Bosco ficou uma fera, pois embora fechada a negociação de clube para clube, faltava acertar com o jogador. Bosco jurou ir à forra. E foi.

Outro fim de treino e, como aprendera o caminho, Lavor novamente, deu uma de cobrinha e, durante meia hora, ouviu um papo de Bosco com um dirigente italiano do Milan, quando foi “acertada” a venda de ZICO. Bosco era, além de gênio na arquitetura do futebol, um artista. Após esperar muito tempo, havia chegado o dia da sua forra. Bosco sabia que embaixo da sua janela havia alguém: Lavor mordera a isca. O papo, na realidade, era um monólogo em que o dirigente italiano só existia na imaginação do supervisor do Flamengo, criador de todo diálogo. No dia seguinte, manchete descomunal: “Zico vendido para o Milan”. Desta vez não foi BOOOMMMBA!!! Foi uma senhora barriga…

Moral de história: Um dia é do gato e, o outro do rato.