Tudo pronto

Treino da Seleção – Sochi – 04/07/2018 (Foto: CBF) Kléber Leite

O problema é que a sexta-feira não chega. Como o noticiário está calmo, e as dúvidas foram dissipadas, não há o que fazer, se não esperar a hora dos jogos.

Cavani não joga. Os uruguaios tentam esconder o óbvio, mas ninguém é bobo. Esta contusão na panturrilha é grave e, o tempo para a recuperação é superior a um mês. Como a Copa acaba no próximo dia 15…

Em função deste desfalque, a França entra como favorita. Se o garoto que vai ocupar o lugar de Cavani (Maxi Gomez) for tudo isso que meu amigo Atílio Garrido fala, quem sabe o Uruguai não surpreende….

No Brasil, Marcelo volta e Tite terá à disposição, no banco de reservas, todos jogadores. Com todo respeito aos belgas, levo a maior fé na nossa Seleção.

E por falar em nossa Seleção, vou deixar vocês com um texto divino do nosso querido amigo Eduardo Bisotto.

Diga aí Bisotto…


Porque me ufano da minha Seleção

Enquanto assistíamos ao jogo da Croácia, o amigo Renan Santos perguntou porque eu torcia tanto para o Brasil. Expliquei de modo bastante superficial que eram minhas memórias afetivas infanto-juvenis. Como sou bem melhor escrevendo do que falando, achei legal escrever este texto.

Comecei a acompanhar futebol com alguma atenção em 1990, aos quatro anos. Não vou mentir: minhas memórias deste tempo são limitadíssimas. Mas lembro de meu saudoso avô xingando os argentinos, o Dunga, o meio-campo da Seleção e nossos zagueiros de tudo quanto foi coisa em italiano na hora em que o Caniggia fez aquele gol desgraçado nas oitavas-de-final. E lembro da minha avó, preocupadíssima com o mau exemplo que o netinho estava tendo, xingando ele de volta e cobrando compostura.

Lembro muito claramente das Libertadores e Mundiais do São Paulo em 1992 e 1993 e o quanto aquilo me alegrava. Lembro também das Eliminatórias pra Copa de 1994. Da crise na Seleção. Do convoca-não-convoca Romário. E da alegria indescritível o dia que classificamos para a Copa com Romário destruindo o Uruguai no Maracanã.

A Copa de 1994, pra mim, equivale a um momento mágico. Lembro de todos os jogos, de cada gol, de como eu idolatrava o Baixinho. Aliás, confissão que só a minha esposa, a Jéssica, já ouviu: tenho medo de encontrar Romário pessoalmente. A chance de eu começar a chorar, abraçar ele e fazer uma fiasqueira do tamanho do mundo não é pequena.

Na final, mais uma vez a imagem do meu saudoso avô vem à mente. Seu Roviglio fumou mais que uma chaminé. Italiano das antigas, num tempo sem politicamente correto, xingou Cafu, que tinha entrado no lugar de Jorginho na prorrogação com alguns ditos carcamanos nada bonitos. Mais uma vez minha avó estava indignada com os péssimos exemplos. E obrigou ele a apagar o cigarro pra fazer a corrente nos pênaltis.

Ganhamos o Tetra. Galvão fez a maior narração de sua carreira. E eu e minha mãe, a dona Celia Regina, fomos para o centro da cidade comemorar. Caçador, no interior de Santa Catarina, minha terra natal, é uma cidade pequena. E foi tudo muito lindo. Enquanto lembro disso tudo, a garganta trava e algumas lágrimas me vem à face. A Banda Marcial Aurora tocando marchinhas patrióticas. A cidade em transe. E minha mãe comprou uma faixa de campeão pra mim, com o nome de todos os jogadores que tinham sido convocados. Fiquei com esta faixa até meus 13 anos.

Em 1998 eu acompahei o grosso da Copa no Internato Adventista Cruzeiro do Sul, em Taquara, região metropolitana de Porto Alegre. A melhor memória é das oitavas-de-final contra um Chile. Foi em um sábado, dia sagrado para os Adventistas. Estávamos na Igreja, ouvindo uma palestra. Eu e meus colegas de quarto bolamos um artifício pra não perder o jogo: levamos um radinho de pilhas e íamos ouvindo um pouco cada um. Éramos quatro no quarto. De dois em dois minutos o fone de ouvido trocava discretamente de orelha. E assim ouvimos e comemoramos discretamente a goleada de 4 a 1.

Em 2002 eu já era um adolescente trabalhando, ganhando dinheiro e na fase de torrar tudo com sexo, drogas e rock and roll. Mais rock and roll e drogas do que sexo, é verdade. Os horários dos jogos eram esdrúxulos: manhã, bem cedinho ou madrugada.

A lembrança mais marcante aconteceu nas quartas-de-final.

Meu padrasto, o Gilmar, não quis levantar pra ver o jogo. Preferiu ouvir no rádio, no quarto. O Brasil mandava na partida contra a Inglaterra, quando Lúcio, zagueiro do nosso Inter (meu, do meu padrasto, do meu avô, do meu tio, do meu pai, enfim, da família inteira), faz uma bobagem sem tamanho e entrega a bola pra Owen abrir o placar. O Gilmar levanta assustadíssimo e emputecido: “Que merda o Lúcio fez? Vai entregar a Copa!”. E eu, com uma calma sei lá da onde, respondo: “Está tudo sob controle. Estamos muito melhor. Vamos virar”. Ao fim do primeiro tempo, empate num golaço em que Ronaldinho Gaúcho matou o zagueiro Ferdinand e pifou Rivaldo pra marcar. No segundo tempo, outra pintura do Gaúcho, enfiando a bola de um ângulo impossível na gaveta de David Seaman.

Na semi outra grande lembrança. Termina o primeiro tempo contra a Turquia. Jogo duro. Ronaldo apagado. Minha mãe e o Gilmar entram na ladainha que tinha marcado os quatro anos: Ronaldo estava acabado pro futebol, era um pipoqueiro, já tinha entregue a Copa na França e ia entregar mais uma. Mais uma vez, não sei de onde uma calma me invade e eu pontifico: “Ronaldo vai fazer o gol da classificação e vocês vão queimar a língua”. Bingo! Logo no início do segundo tempo, de biquinho, a lá Romário, Ronaldo nos coloca na final.

E na final, delícia das delícias, o acabado para o futebol, o aleijado, o pipoqueiro, marca mais dois em cima daquele que injusta e absurdamente foi eleito o melhor jogador daquela Copa, o goleiro alemão Oliver Kahn. Brasil pentacampeão.

Já escrevi em outra oportunidade que boa parte da graça do futebol acabou para mim no dia em que vi, dentro do Gigante da Beira-Rio, junto com algumas dezenas de milhares de almas coloradas o tão sonhado título da Libertadores.

Mas nunca deixei de torcer pela Seleção. A camisa amarela ajudou a forjar minha identidade nacional. A gostar do Brasil, mesmo com seus milhões de problemas. A me emocionar com o hino.

No dia do famigerado e desgraçado 7 a 1, arranquei a televisão da tomada no 3 a 0 e me recusei a ver o resto. Fiquei muito puto. E fiquei ainda mais puto quando os asnos da CBF anunciaram Dunga como substituo de Felipão.

Mas nem Dunga me impediu de seguir torcendo para o Brasil. De esperar o melhor. De me emocionar com as conquistas. E ficar triste nas derrotas.

Sinceramente, não consigo compreender quem odeia Neymar, um dos três melhores do mundo pelo menos desde 2014. Não consigo entender quem transforma a Seleção em símbolo sintético da própria frustração e culpa nosso maior case de sucesso pelos fracassos constantes do Brasil.

Se existe algo do qual o Brasil sempre pôde se orgulhar, este algo é o futebol. E nada é superior à nossa Seleção.

Contra o México vencemos mais uma etapa. Faltam só três.

Se Deus quiser, vamos buscar o hexa. E enterrar, ainda que momentaneamente, esta avalanche asquerosa de vira-latismo que soterrou o país nos últimos quatro anos.

Que venha a Bélgica. E depois, França ou Uruguai.

“A Copa é a Pátria de chuteira no pé”.

“Com jeito, com raça, com jinga e amor.
No peito, com graça, seja como for.
Nós vamos juntos sentir esta emoção.
E a galera explode o coração!”.

Vai Brasil!

Eduardo Bisotto

DE VOLTA PARA KLÉBER LEITE

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