(Foto: Camilla Maia/ 10.03.1997)

Salve Romário, o trampolim rubro-negro

Confesso que fui pego de surpresa, com muitos telefonemas de companheiros de imprensa querendo me ouvir sobre a data histórica de 10 de Janeiro de 1995, quando foi anunciada a contratação pelo Flamengo de Romário que, acabara de ser o protagonista da conquista do tetra com a camisa 11 da Seleção Brasileira e, recém eleito pela FIFA o melhor jogador do mundo.

Muito bom voltar no tempo. Curioso é que todas as imagens que passam na minha cabeça estão tão fresquinhas que não parecem ter 25 anos.

Seria impossível alguém imaginar que um clube brasileiro, com tantos problemas, pudesse em 10 dias retomar a dignidade, honrando os compromissos assumidos com os profissionais do futebol e seus 600 funcionários e, de quebra, anunciar a contratação do melhor jogador do mundo. Tudo isto aconteceu entre os dias 1º e 10 de janeiro de 1995. Romário foi o presente antecipado, no ano do centenário rubro-negro, para a mais apaixonada torcida do planeta.

Papai do Céu e São Judas ajudaram, juntando a fome, com a vontade de comer. O Flamengo precisando dar uma grande sacudida em sua torcida e, Romário, morrendo de saudade de tudo que amava.

Gilmar Ferreira, querido amigo, após ouvir de mim o sonho de ter Romário no Flamengo, deixou a entender que, se o Baixinho tivesse confiança, se houvesse um projeto sério, quem sabe…

Gilmar Ferreira gozava da amizade de Romário e, se deixava no ar esta possibilidade, por que não começar um grande projeto?

Conversei com Romário e, de forma rápida e pragmática, me passou o dever de casa que, em menos de uma semana estava pronto.

O montante para a contratação veio da iniciativa privada. Pool de empresas – Brahma, Banco Real, Pinto de Almeida, Banco Bozzano, Multiplan e Rede Bandeirantes.

A engrenagem, simples. O dinheiro aportado por cada uma das empresas retornava em mídia na Band, além do direito de uso da imagem de Romário.

Na minha chegada a Barcelona, o discurso era no sentido de que o Flamengo lá estava para ajudar Romário, cuja alma pedia seu retorno ao Brasil e, consequentemente ao clube espanhol, que teria uma saída justa e honrosa.

Meio desconfiado, Juan Gaspar, vice presidente do Barça, me recebeu em seu maravilhoso hotel. Fui colocado em um salão enorme, onde no meio, havia uma pequenina mesa redonda e duas cadeiras. Meus amigos psicólogos disseram que esta é uma estratégia para que o “convidado” tenha a noção da grandeza de onde está e, por tabela, se sinta diminuído. Se é isso mesmo, jamais saberei.

O que sei é que Juan Gaspar se apresentou e, sem a menor cerimônia, foi dizendo que sabia da minha condição de presidente recém eleito e, entendia a minha estratégia em querer aparecer. Disse isso sem a menor cerimônia e propôs que ficássemos mais quinze minutos e depois comunicássemos ao batalhão de imprensa que nos aguardava, que, infelizmente, não havíamos chegado a um acordo. Posteriormente, soube que o pessoal do Vasco havia a ele informado que era eu um aventureiro e que o Flamengo estava falido.

Com toda educação, retruquei afirmando que antes de ser presidente do Flamengo já era uma pessoa conhecida no meu país e que a vaidade estava longe de ser motivo para que ali estivesse e que, efetivamente tinha a intenção de contratar Romário.

Juan Gaspar ouviu e de forma, talvez, arrogante, disse o valor a ser pago, em pesetas. Pedi que transformasse em dólares. A resposta foi rápida: – quatro milhões e meio de dólares!

Olhei para ele e disse: – Quer dizer que, por esta quantia, o Barcelona cede Romário ao Flamengo?

Juan, meio desconfiado, disse uma única palavra: – Exatamente.

Estendi a mão direita e disse: – Está fechado!

Ele, de mão mole incrédula, perguntou: – Mas como você vai pagar?

Respondi:  – “Con plata. Cuatro millones y quinientos mil dólares americanos en el banco indicado por vos”.

Juan pediu tempo. Sugeriu que não saíssemos logo, pois pegaria mal para ele uma decisão tão importante ter sido resolvida tão rapidamente.

Daí, após quase uma hora, fomos para a coletiva de imprensa e lá, com prazer, enchi a bola de Juan Gaspar, a quem reverenciei como um exímio negociador.

No dia seguinte, várias “cascas de banana” foram colocadas para que o contrato não pudesse ser assinado. Caso a caso, com paciência e a grande ajuda de Branchini, procurador de Romário, tudo foi resolvido e pegamos o avião pelo rabo, já com as portas sendo fechadas. O desembarque no Brasil, uma loucura…

Lembrando aqui do nosso Bruno Henrique, naquele momento o Flamengo mudava de patamar. De quatro, passamos a ter quarenta mil sócios. Dali nasceu o sócio torcedor que, hoje, representa o segundo faturamento do Flamengo. Ali nasceu a FlaTV e, graças a esta ação, o marketing virou arma preciosa, propiciando novas receitas que possibilitaram a manutenção da dignidade do clube que, durante os quatro anos ininterruptos em que lá estivemos, honrou todos os seus compromissos.

Tudo isto foi possível graças à firmeza e retidão de caráter de Romário. Quanto a mim, a alma em festa eterna por ter participado e contribuído para que o mundo entendesse o real tamanho do Flamengo.