O anti Flamengo

A noite de quinta-feira foi um dos piores momentos que tive na vida. Talvez neste depoimento fique claro a importância do que representa o Flamengo para mim.
Inacreditável o que se viu na reunião do Conselho Deliberativo, onde compareceram 242 conselheiros, com a finalidade de julgar se a decisão anterior deste mesmo conselho – que ratificara o título a mim outorgado de Grande Benemérito – era válida, pois havia um recurso do sócio Artur Rocha, alegando que 16 conselheiros, entre centenas, estavam inadimplentes.
A reunião citada ocorreu no dia 21 de julho de 2021, mesmo mês em que mais de 40.000 brasileiros perderam a vida, pois estávamos no olho do furacão da pandemia.
Dos 16 sócios, 14 estavam atrasados dentro do próprio mês, por questão de dias. Período complicado em que, face a pandemia, havia uma comoção nacional em tentar administrar entendimento entre quem esperava receber e quem estava devendo.

Paralelo a tudo isso, o estatuto do Flamengo é mais do que claro. Somente na Assembleia Geral, isto é, quando houver eleição para presidente e vice, os sócios inadimplentes não podem participar. O estatuto, em momento algum, inviabiliza por inadimplência a participação do associado em reuniões de qualquer conselho do clube.

A má fé no recurso fica escancarada quando se nota que, anteriormente à reunião do Conselho Deliberativo em 21 de Julho de 2021, em NENHUMA convocação havia a obrigatoriedade do sócio estar quite com o clube. Isto jamais foi exigência em nossa para lá de centenária existência.
Como havia o inconformismo de ter perdido no voto, a “genial” ideia foi procurar algum detalhe que tivesse ferido o estatuto e, por conseguinte, anular o que o voto havia decidido. Como última boia, foi sacada da cartola esta argumentação absurda, desumana e em total desacordo com o estatuto.

Pior ainda, abrindo um precedente perigoso, pois ao longo de 127 anos, jamais, em tempo algum, foi contestada qualquer decisão, através do voto, do Conselho Deliberativo, principal guardião dos interesses do clube.

Por fim, tive a oportunidade de deixar claro o real motivo desta perseguição alucinada que sofro por parte desta pessoa já aqui mencionada.
Em 2005, após ter colaborado, em dupla com meu amigo Hélio Ferraz, em jornada dificílima, evitando o rebaixamento, assumi a vice-presidência de futebol, atendendo apelo do presidente Márcio Braga. Nesta época, por motivo de saúde, Márcio teve que lidar com algumas ausências. O vice geral era Artur Rocha, com quem tive que conviver.
Um belo dia, recebi um telefonema que vinha da sala da presidência. Do outro lado da linha, o vice-presidente do clube me informava que estava negociando com um jogador colombiano, que deveria estar chegando ao Rio em dois ou três dias.
No ato, disse: “Arthur, desculpe, mas a banda aqui, agora, toca diferente. Qualquer jogador para ser contratado deve ter a aprovação da Comissão Técnica. Por favor, me diga de quem se trata que encaminharei ao diretor Eduardo Manhães e ao supervisor Isaías Tinoco, para que, com o treinador, avaliem.”
Senti do outro lado da linha uma saia justa. A nossa postura ética batia de frente com o interesse do vice-presidente.

Uma semana depois, outro telefonema: “Kleber, o jogador colombiano chegou e está na minha sala. Vou com ele aí para o futebol. Preciso que você organize uma coletiva de imprensa para apresentá-lo”.
Respondi da seguinte forma: “venha para cá, faça você a coletiva de imprensa apresentando o jogador, que farei outra, paralela, dando a minha versão sobre o que está ocorrendo.”
Ante minha reação, não houve nenhuma coletiva. Daí em diante, ante o exposto, nenhuma nova tentativa em emplacar um novo Dimba. Aliás, houve uma. Ganhei um inimigo. O único em toda minha vida.
Meus amigos me recriminam pela facilidade em perdoar. Se é defeito, vou morrer assim. Não tenho tempo e espaço para carregar rancor. Isto destrói a alma. Deleto. E vida que segue…

Este desabafo a todos os duzentos e tantos conselheiros precisava ser feito. Afinal, esta perseguição precisava ser explicada. Passou do ponto, mesmo para quem tenta conviver bem com todos, inclusive, com os que não falam à alma.

Para finalizar. Esta reunião do Conselho deliberativo foi o anti Flamengo. Meio que como tivéssemos voltado ao século passado.

Como o número de presentes foi de 242 conselheiros, quem recorreu tentando anular a decisão do conselho precisava de 122 votos, só tendo alcançado 108, não haverá outra alternativa ao presidente do Conselho Deliberativo, Antonio Alcides, senão anunciar que, finalmente, a absurda e nociva pretensão aos interesses do Flamengo está sepultada.

Que fique a lição. O que se viu nesta reunião foi o anti Flamengo, que perde, decepciona, entristece, envergonha e vira chacota.

Página triste, virada.